Um Brinde à Poesia

Um Brinde à Poesia

domingo, 27 de outubro de 2013

Um Brinde à Poesia Rio 10 - O Retorno, no Museu da República

  


No ano de 2012, decidi atravessar a ponte e estreamos na Livraria do Café, no Shopping da Gávea, onde foram realizadas oito edições. Na última aconteceu na Semana da Poesia, em março. Tivemos a honra de receber o escritor Ferreira Gullar. foi inesquecível e deixou saudades!
A livraria fechou e a convite dos poetas Tanussi Cardoso e Angela Maria Carrocino, fizemos uma belíssima edição no Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, em abril. Sou eternamente grata por esta passagem em tão acolhedor local. 
Nestes cinco meses busquei possíveis lugares para continuar nossos encontros, mas nada ficou acertado. Uma das pessoas que mais me acompanhou nesta busca, foi a amiga Marcia Mendes, inclusive dando ótimas dicas, até chegarmos no Museu da República. Aqui expresso meus sinceros agradecimentos e considerações.
Muitas vezes pensei em ficar só com a edição no MAC Niterói mas não sou de desistir fácil. Aliás, quando começo uma coisa, mesmo que siga lentamente, vou até o final. Sem dúvida a força, as palavras de incentivo, a amizade e o companheirismo fizeram e fazem a diferença. Agradeço a todos que torceram para que a nova casa do "brinde", no Rio, fosse encontrada.Obrigado amigos e parceiros! Este espaço é nosso. Terei imensa satisfação em recebe-los. Somos um único verso.
Estamos perto deste dia que fará diferença na história do Um Brinde à Poesia. Conto com a presença daqueles que frequentaram os saraus na Gávea, aqueles que continuam acompanhando as edições em Niterói e aqueles que ainda não conhecem o "Um Brinde", para participarem deste momento especial. Antecipadamente, agradeço de coração e expresso o meu carinho.
É com imensa alegria que convido para Um Brinde à Poesia Rio 10, em parceria com a Livraria Mini Book Store e o Museu da República. Vamos celebrar!
Com imenso prazer, irei apresentar esta programação especial, contando com a ilustre presença do escritor Tanussi Cardoso para uma entrevista e interpretação dos seus poemas. Receberei a escritora e psicanalista Marcia Mendes que fará leitura dos poemas de sua autoria. Celebraremos o Centenário de Vinícius de Moraes. A abertura da noite fica por conta dos Convidados Musicais : 2 - Mari Blue (voz) e Federico Puppi (violoncelo) e do mineiro Mario Wamser (violão). Haverá o “Momento D’versos” em que todos podem participar com um poema ou uma música. E encerraremos a noite com Versos a Circular – Celebração, num círculo brindaremos à poesia, celebrando a paz e a liberdade de ser.

Sorteio de brindes.

Local: varanda da Livraria Mini Book Store, Museu da República

Contato Lucília Dowslley: (21) 82229865







CACHOEIRA
Lucília Dowslley


Minha cachoeira
corre corredeira
água na ladeira
vai lavando a gente
toda lá por dentro
leve fica o peito
desta corredeira
que a vida corre
corre a vida inteira
se mergulha fundo
no fundo é amor
tudo que se sente
brota na semente
no sonho ou na mente
vislumbrando o dia
de raiar contente
sente transparente
gota reluzente
espalhar seu canto
isso é inerente
Designadamente
nada que se entende
corre conseqüente
ciclo que é corrente
independentemente
daquilo que se sente
flui fonte incandescente
além do consciente.

Parte 2

Se não compreende,
feche os olhos tente
tudo é vazio trocando formato
constantemente
tempo e espaço
já tão transparente
na alma escorre
fonte inesgotável
elemento agente
de toda emoção
rege equilíbrio
razão voz poesia
coração canção.







NUDEZ

Que importam

as pessoas

a não ser

no momento

infinito

                                                                                  e raro

em que elas

                                                                       sem caricaturas

despem-se de todo

o artifício

e frias

e loucas

são elas mesmas

nuas?


TANUSSI CARDOSO
(de “Boca Maldita”, Ed. Trote/RJ - 1982)



OLHOS
para Celso Moreira da Silva, em memória


Há dias em que qualquer movimento
me assusta:
o barulho simples de sílabas soltas,
de sol saindo,
de lua saltando.
Há dias em que me assustam
qualquer sombra,
qualquer espelho.
Risos nos sulcos da noite.
Sussurros de cobras no cio.
Uivos de cão no silêncio.
Há dias em que tudo me assusta
como se, frágil,
a vida escorresse líquida
por minha garganta de aço.
Há dias em que é melhor
fechar janelas,
correr trincos nos olhos,
esquecer o vento lá fora.
Dormir só.
Como se o cavalo da manhã
trouxesse na crina da aurora
a felicidade.

TANUSSI CARDOSO



BELCHIOR REVISITED ou VARIG! VARIG! VARIG!

Não foi por medo de avião
que segurei pela primeira vez a tua mão
: foi por tesão.

TANUSSI CARDOSO
(de “Boca Maldita”, Ed. Trote/RJ - 1982)


  

ÚLTIMA SESSÃO DE CINEMA

I
Os olhos de Marlon Brando na tela
e o peito sussurrante da menina bela.
A boca de Marlon Brando na tela
e as mãos da sorte nos seios dela.
As coxas de Marlon Brando na tela
e o suor do púbis doía nela.

II
A mão no escuro
escolhe o momento
exato de agir.
Ágil,
segura as coxas
da menina ao lado.

(Rock Hudson
beija
Elizabeth Taylor)

As pipocas
se contorcem
de prazer.
TANUSSI CARDOSO
(de “Boca Maldita”, Ed. Trote/RJ - 1982)


  

LUIZA

Deu pro primeiro viajante
que chegou
- não queria.
Depois foi o segundo, o terceiro
que passou
- não queria.
Depois Luiza amou até arder
e chorou
- não queria.
Depois embarrigou e ao seu filho
arrotou
- não queria.
Pelas estradas cresceu
rosa vermelha de dor
- não queria.
Penou de fazer dó
na vida inteira só
- não queria.
De amarga ela azedou
e seu corpo se fechou
- não queria.
Nas noites de algum dia
calmamente se sangrou
- e sorria.

TANUSSI CARDOSO
(de “Boca Maldita”, Ed. Trote/RJ - 1982)
SINAL

Escorreguei em mim mesmo
e caí.

Sou um acidente.

TANUSSI CARDOSO

(de “Boca Maldita”, Ed. Trote/RJ - 1982)


LUZ DE OLHAR
Marcia Mendes

Luz de olhar,
Teus olhos são a chama da tua beleza
E teu corpo, João,
Fome em abundância.
Prenúncio das flores da primavera,
Tua imagem em meu espelho reflete
Nítida beleza masculina.
Sou eu aquela que te adora tanto.
A natureza,
Que te fez belo homem,
Já pinta de branco teus cabelos,
E tu, João, ris da ruína do tempo.
É contigo que quero os verões e os invernos,
A harmonia dos sons,
nos teus cantares,
E o relampejo do teu amor,
Que se despeja.

***

TEMPESTADE
Marcia Mendes

Com o sorriso,
Cortejo a tristeza.
Sem ter o que dizer,
O tempo
Deixa a porta aberta
E me chama.
Fora,
a tempestade
Que grita como fera.
Acendo a alma
E a encaro.
A vida é clara e
a morte também.

***

PERMANÊNCIA
(Minha Avó)
Marcia Mendes

Minha avó gostava de crisântemos na janela,
Flor da nobreza.
Não eram bonitos nem feios,
Mas agüentavam aquele calor suburbano.
Um dia ela acordou rica de tristeza,
Botou o crisântemo amarelo na taça de vinho
E foi viver mais.
Todo mundo quer permanência.

***

O MAR E EU
Marcia Mendes

No mar,
Sou mais que eu.
Confidencio com as águas.
Infiéis, espalham segredos na areia.
(não me importo).
Vôo com os pássaros,
Para além da pedra musgada.
Promessa de inverno
Na aragem já fria.
Estrela azulada no céu,
Lua jorrada de sol,
Folha apodrecida na praia,
Sombra do desamparo no chão.

***

 ONDE MEU ANJO MORA
Marcia Mendes

Tem um vão dentro de mim
Onde meu anjo mora.
Luz das minhas manhãs
De um tempo que tardou
E não amanheceu.
Estrela de um outro céu
Que na calada do silêncio
Me acena, me ri, me chora
E preenche minha existência.

***

FLOR POEMA
Marcia Mendes

Por entre as nuvens de setembro,
Pôs-se o sol no meu silêncio.
Escorregou entre dedos
Como o rio que não se represa.
Foi-se,
Na palidez do tempo.
Sem adeus,
Entrou no mar.
Senhora do ritmo, vou-me,
Sem servilismo ou rimas.
Evoco sombras,
Dobro esquinas,
Caminho entre versos,
Álamos-fantasias.
Abrigo-me em palavras sobreviventes
Que rasgaram a tarde escarlate
E despencaram da vida.
Dilúvio de sensações,
Enlaces e desenlaces.
Alimento e grão.
Como serva da linguagem,
Emudeço.
Sobrevivo na quietude
Onde as palavras circulam,
Roucas, em suposta consciência.
Contudo,
Enquanto a lua,
Em segredo,
Clareia a noite,
E seu rastro de luz prateia o mar,
A Poesia emerge do vai-vem das ondas
Como a flor submersa que cresce
No azul que espelhou o céu.
Nem tão feia, nem tão bela,
Insígnia da minha liberdade,
A flor que virou poema,
Deita a alma em versos
De pétalas reluzentes
E acusa a poesia
Do mar que esbraveja aqui dentro.

***